Educação Somática

A Educação Somática poderia estar no SUS?

Tempo de leitura estimado | 7 min.

 

Mobilizar, sentir, perceber, imaginar… Palavras presentes para quem já vivenciou alguma prática somática e que experimentou no corpo e movimento as perspectivas de uma abordagem delineada a partir do século XX interessada na equilibração sistêmica do corpo a partir de seu autoconhecimento, estrutural e funcional. Essas experiências largamente conectadas com a dança e com as terapias integrativas agrupam relatos de bem estar e de ganho de qualidade de vida por seus adeptos e em um cenário que nasce distante das universidades, mas que ganha cada vez mais o olhar de pesquisadores e agências de saúde ao redor do mundo é importante perguntar: A Educação Somática poderia estar no SUS?

Nesse post, mergulharemos em uma revisão governamental para diretrizes de saúde pública do governo australiano publicada em 2015. Sob o título “Reviews of the Australian Government Rebate on Natural Therapies for Private Health Insurance”, o trabalho delineou os achados publicados sobre as terapias naturais (ou integrativas?), entre elas exemplos de práticas somáticas, que poderiam ser inseridas como intervenções clínicas no sistema de saúde privada do país. O documento reúne diversas abordagens, mas nesse texto cobriremos as informações relativas ao Método Feldenkrais, Alexander Technique e Rolfing.

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Logo de início é importante ressaltar a grandeza de um relatório como esse e o trabalho gigantesco em reunir informações com respaldo técnico e científico que possam balizar uma política pública de saúde. O texto que nos baseamos nesse post é aquilo que comumente é chamado de uma Meta-Revisão, ou seja, uma revisão de várias revisões sistemáticas. Um trabalho que dura no mínimo 12 meses de empenho com um alto grau de rigor estatístico e de seleção de conteúdos. O objetivo da revisão foi indicar evidências de qualidade que demonstrassem eficácia clínica, custo-efetivo razoável e segurança na intervenção ao paciente.

Mais do que garantir a existência de evidências para uma intervenção clínica, é necessário que se observe a qualidade das evidências observadas. Um estudo científico por si só não garante uma “verdade”, por isso, os relatórios de gestão pública avaliam sistematicamente as publicações classificando os resultados encontrados, podendo ser excluídas por seu baixo índice de evidência ou presença de falhas metodológicas.

O cenário visto

As revisões encontradas sobre os temas que nos ocupamos nesse texto foram pequenas e caracterizadas com índices baixos ou moderados de evidência. Isso se deu pela quantidade de estudos publicados, falhas nos grupos controle e algumas presenças de viéses que impediam uma classificação superior dos trabalhos.

Ok, isso já é suficiente para abandonarmos o barco?

Não, não é. A baixa qualidade da evidência indica que novos estudos são necessários para que se alcance efetiva indicação de um tratamento/intervenção e, assim, não  se descarte a possibilidade da eficácia de uma terapia ou prática somática.

Os passos da ciência são pequenos e lentos, é desta forma que se aumenta a probabilidade dos acertos e dos ganhos para o bem comum.

 

As práticas observadas e seus achados

A respeito da Técnica de Alexander, o estudo encontrou evidências classificadas entre média e alta qualidade que traziam contribuições para o manejo de lombalgias e dores neuromusculares. Especificamente sobre as dores lombares, as indicações de eficácia a curto prazo pode ser efetiva, mas a manutenção do estado a longo prazo nos sujeitos é incerta.

Ao observar as publicações sobre o Método Feldenkrais, a revisão encontrou baixa qualidade da evidência e alto risco de viés em alguns estudos selecionados. Embora existam bons relatos a respeito do tratamento de dores crônicas, patologias neuromusculares e musculoesqueléticas, as evidências não foram suficientes para haver uma recomendação da abordagem.

Não foram observadas revisões sistemáticas para o Método Rolfing. Como resultado, não houve a possibilidade  da equipe de exibir qualquer posicionamento a respeito da abordagem, uma vez que a ausência de estudos desse tipo exclui a possibilidade de observação nos mesmo moldes que os demais métodos descritos.

A Educação Somática poderia estar no SUS?

Para professores e alunos de educação somática é inegável o despertar de bem-estar para o corpo e movimento no pós prática. As práticas do movimento somático são amplamente procuradas para reabilitações neuromusculares e musculoesqueléticas e que compõem um eixo de terapias naturais que apresentam bons retornos aos pacientes.

Ao pensar o Sistema Único de Saúde brasileiro (SUS), referência mundial no tratamento de diversas patologias e modelo de saúde pública internacional, poderíamos vislumbrar a presença de práticas somáticas em seu escopo de intervenções na medida em que novos estudos possam ser levantados e que construam uma coluna forte e flexível para a abordagem como política pública de saúde.

Por hora, as evidências observadas não conseguiram garantir que esse movimento possa ser lançado no ponto que tocamos nesse texto. Contudo, sabemos que o rigor científico existe para que se garanta um controle sobre aquilo que se intenciona descobrir ou indicar. Esse rigor faz com que resultados positivos com as abordagens sejam abandonados não pela impossibilidade de serem eficazes em uma população (nesse caso), mas pela necessidade de que se fomente em larga escala os estudos sobre o tema, corroborando para uma indicação generalizada.

O valor da ciência nesse processo

Garantir o fomento às abordagens integrativas pode ser uma chave a mudança do cenário atual. Afim de que, no futuro, podendo se ofertar o acesso à terapias do movimento como política pública.

Valorizar o trabalho do pesquisador e fomentar as parcerias entre universidades e educadores somáticos é um caminho para a modificação do cenário atual. 

O que será que nos aguarda?

Enquanto não sabemos seguimos nos aproximando daquilo que nos ajuda e nos distanciando do que nos atrapalha, afinal, se é necessária uma revisão sistemática (ou várias) para a implementação de uma política pública, ela não é necessária para que cada pessoa [soma] decida o que deve e o que não deve ser experienciado.

#deixamover

 

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Referências:

Wardle, J. (2016). The Australian government review of natural therapies for private health insurance rebates: What does it say and what does it mean? Advances in Integrative Medicine, 3(1), 3–10. doi:10.1016/j.aimed.2016.07.004

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Sobre o autor

Maercio Maia

 

Neurocientista, Bailarino e Educador do Movimento. Criador do deixamover, a única plataforma brasileira a entrelaçar saberes da educação somática, dança e neurociência.

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